Hoje, sinceramente, penso que o guardião da gruta estava, somente, na nossa imaginação, na ilusão acalentada e consolidada dos nossos sonhos inocentes, doces, infantis.
Sunday, June 24, 2007
O Pintor sem Rosto!
O Pintor sem Rosto!
O suposto guardião da gruta dos nossos sonhos era o Nóbrega.
Nunca o entendi verdadeiramente. A sua postura fingia ignorar-nos ou ignorava-nos mesmo. Havia nele algo de sofrido, ausente do mundo. Sentava-se à porta de sua casa num banco de madeira tosca e pintava.
Expunha os quadros ao longo daquela rua, mas nada fazia para os vender.
Olhava-os demoradamente.
A sua Arte parecia absorvê-lo, extasiá-lo.
As suas obras pareciam deliciá-lo, mas ele não estava ali, disso tinha eu a certeza absoluta.
Por vezes, imaginava-o em sonhos, montar num cavalo alado e cavalgar rumo a destino incerto, distante dali, até ao infinito.
O pintor não tinha corpo, habitava somente o espírito e a alma! Mesmo a gruta que era sua, estava certo, que ele não a conhecia.
Quando passávamos com medo dele, nunca proferiu um gesto, uma palavra. Intimidava, somente, não sei por quê. A par disto, nunca ouvi a sua voz, pois, não articulava um som, uma sílaba, uma letra, pelo menos que saísse para o exterior de si.
Talvez falasse com o seu interior!
Nunca consegui sequer, ler-lhe os olhos para sentir um pensamento, uma emoção, pois, quando passávamos furtivamente, estava sempre de costas viradas para nós.
A avó Maria nunca soube das nossas investidas ali.
Quando alguém falava do pintor sorria com ternura e abraçava o olhar, de forma aprazível e misteriosa.
Hoje, sinceramente, penso que o guardião da gruta estava, somente, na nossa imaginação, na ilusão acalentada e consolidada dos nossos sonhos inocentes, doces, infantis.
Hoje, sinceramente, penso que o guardião da gruta estava, somente, na nossa imaginação, na ilusão acalentada e consolidada dos nossos sonhos inocentes, doces, infantis.
Pena. Junho 2007."Recordações de Infância"