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Sunday, June 17, 2007

Diário na voz de um Cidadão


Diário na voz de um Cidadão


Por entre as vastas curvas da estrada aconcheguei o olhar na paisagem que se vislumbrava do belo Douro. O rio Douro da minha inesquecível infância. Calcorriei-o muitas vezes, em diabruras e jogos que me recordo com nitidez.

Era-me familiar ao olhar.

Nas encostas vividas de socalcos, as suas vinhas magníficas espraiavam-se num cenário interminável de beleza parecendo não terem fim. A linha férrea parecia rasgar as montanhas sobranceiras ao rio, num arranjo delicado, como a pedir licença, autorização para o fazer. Delicioso, tal era a delícia que vivia no instante.

Como tudo era verde! Como que transformadas por varinha mágica num relvado suado pela mãos dedicadas dos seus zeladores. A eterna azáfama feita de sangue derramado. A sensibilidade do trabalho de gerações e gerações sucessivas.
Relembro agora a sua estação de comboios, um alpendre de sonho, o mistério escondido nela. Mero aparato de mim. Mera visão nunca esquecida e também nunca indiferente.

As voltas que o Mundo dá.

Como tenho amor àquela visão de sonho, de maravilha, que me arrebataram e conquistaram por completo.
Parece que regressei ao que era. Ou antes: ao que fui! Como lhe depositei o meu amor. Gentes nunca cansadas, viciadas no amor na terra, sofredoras, mas silenciadas pelo peso da enxada com que sempre existiram e coabitaram. Trocaram tudo, uma vida, por aquele amor.
Choraram para si. Só para si. Disparataram para com eles e elas. Nunca incomodaram ninguém. Entregues a si próprias. Falaram palavras duras num monólogo surdo. Nunca cederam. Se passaram a fronteira do País para ambicionar vida melhor, regressaram de imediato e, com amor regressaram ao que sempre foram.
Isto é o Douro. Tantas vezes cantado, tantas vezes ignorado, tantas vezes de eleição, nos pensamentos lindos dos que o viveram numa entrega total, de carácter íntegro de um tesouro riquíssimo saído da arca da vida e, que é, exclusivamente seu. Posse sua.
As inúmeras curvas deram-me alegria. O quadro pintado com carinho trouxeram-me ternura, magia, contentamento. A recordação. A recordação das noites quentes de Verão, feitas de luar majestoso, só observando. Puro êxtase de prazer!
Como amo as inúmeras curvas que fiz hoje, transformadas agora em desnecessárias modernices de rectas de auto-estrada. Penso num progresso moderno que não substitui a eterna beleza de outrora, que permanecerá sempre comigo. Onde contemplei um sonho.
Como amo o Douro. As gentes. O seu amor à terra, nas lágrimas vertidas de suor agarradas sempre às enxadas do trabalho árduo.
Parei. O tempo parou. Naquele momento perpassou por mim a ambição de rever tudo e, revi.
Delícia, Maravilha, Encanto!
Regressei por aquela estrada do Douro, que faz de mim o que sou.
O Douro estará sempre no aperto dos meus braços sentidos. Sinceros.
Amo o Douro! De forma eterna! Inesquecível!


Pena. Junho.2007. "Viagem sem trajecto de regresso"