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Saturday, November 18, 2006

O Que me vai cá por dentro

O Que me vai cá por dentro


É Sábado. Um dia da semana em que decidi que seria para escrever. Escrever o quê? Não sei. Só escrever!
Estou com uma enxaqueca tremenda, desnorteante mesmo. Os termos mais correctos são: uma dor de cabeça avassaladora! Escrever não se torna fácil, brincar um pouco, jogar e entreter-me ternamente com as palavras para lhes darem a dignidade e a eloquência que me merecem. Merecem mesmo, sempre. Atenção e encanto.
Assolado como me encontro tento despejar frases com um contexto lógico significativo que não vão suscitar interesse a ninguém. De certeza! Também não é o que pretendo! Que poderei dizer, então? Tenho que as soltar. Desprenderem-se. Agirem soltas, indo ao encontro do contexto que as fazem comunicar, expressar e fazer pensar! Essencialmente pensar! Nunca abdicarei de lhes prestar a atenção que merecem.
O meu filho convidou um amigo para, em conjunto, lutarem ferozmente, com a Playstation 2. Fazem uma algazarra desmedida, imbuídos numa brincadeira inofensiva para meu infortúnio e desgraça mental, colocando-me numa situação angustiante para me concentrar. Estas coisas deveriam ser proibidas ou então, a carnificina do jogo deveria ser silenciosa. Emitem risinhos de entusiasmo.
Sinto-me como se alguém me desse uma paulada na cabeça, com pontaria certeira para travar o pensamento e as ideias, mas insisto em fazer isto. Escrever é mesmo complicado, extremamente infrutífero, se não for ao desenrolar normal da pena, ao encontro das palavras, numa batalha fluida, leal, que consista em formar frases com sentido e coerência. Disputo umas e outras e digladio-me com elas deliciado, tentando construir significados que me parecem fugir, escorregar, rumo ao absurdo existencial e entranhando-se bem no seu seio. Afinal porquê?
Deveria estar sossegadinho a um canto, sem fazer nada, infeliz, à beira de um ataque de preguiça, de nervos, ou a dormir tranquilamente na minha cama, compensando noites brancas, repletas de vazio e de nada, difíceis de digerir pela ineficácia e contrariedade existentes, tornando-as num desperdício de tempo. Ocas de significado! Ocas de conteúdo!
No entanto, palavras é o que povoam mais a minha desgraçada cabeça e alguma coisa terá que sair, para me libertar das frases imaginárias que me consomem e que me desgastam constantemente os já poucos neurónios que se agitam em mim. As palavras. As imensas palavras coabitam comigo. Não se desprendem. Insistem que as ordene, anseiam por me serem úteis. Servirem para alguma coisa. Guiarem-me com precaução e dedicação. Fazerem parte de mim!
Tento manter a calma. A vida resume-se a muito pouco e eu devo aproveitar todos os seus instantes, sem protestar, nem me revelar insatisfeito com as pessoas que me rodeiam, nem com atitudes bruscas e imprevistas de mau humor que só contribuirão para causar desagrado e destroçar sentimentos puros e esperançados de uma conduta familiar e social aprazíveis, adequadas e, que primem, pela pacatez e pelo entendimento.
Decidi já há muito tempo que teria de fazer boas acções, como um dedicado jovem escuteiro dos meus tempos e comportar-me convenientemente. A ovelha ranhosa da família que sou, abandonar-me, eclipsar-se, e eu ser acessível. Ser capaz de estabelecer diálogos e conversas aparentando uma normalidade que me foge a cada instante e esforçar-me por os tornarem contentes e confiantes na relação que estabeleço com eles.
Prometi a mim mesmo que iria fazer isso, sem dúvida nenhuma! Assumi isso como um compromisso de honra ou um desafio imposto a mim próprio, sem hesitações e, plenamente convicto, de que me irei sair bem. Por certo, todos aplaudiriam até à exaustão! E, eu resolveria o meu problema de estar sempre indisposto e a despejar impropérios de forma inconveniente, fazendo-os sofrer injustamente. Eu sou assim!
Vou esforçar-me, podem crer! Tenha a absoluta certeza que todos os olhares confluiriam na minha direcção, inequivocamente, plenos de estupefacção e, também, de surpresa! Imensa estupefacção e surpresa! Prometo que vou esforçar-me com toda a energia que possuo em mim transformando a minha forma de ser e de agir e, quando penso nisto, sinto um sorriso ímpar estampar-se no meu rosto e no rosto de todos os que verdadeiramente me conhecem. A ovelha ranhosa que existe em mim vai esbater-se, desaparecer, por mais que me custe. Não! Não sou tão mau como me tomam ou querem conotar-me. Existo! Sou! Também vivo e sou sensível. Somente sou isto!
Entretanto, o crepúsculo abate-se, pausadamente, sobre a minha frágil silhueta e sobre a minha adorada cidade, vislumbrada através da janela do lugar onde estou.

Acendo um cigarro e aspiro uma longa baforada. Sei que não devia fazê-lo. Até nisto sou uma ovelha ranhosa: Sou o único fumador assumido da minha família! Sou constantemente censurado por esta atitude que não me larga. Sim! Ao menos admitam-me este vício que me reconforta, que me auxilia. Prejudica-te a saúde e a dos outros! Só faz mal! - Dizem, conscientes da minha conduta, algo díspar e subversiva, profundamente condenável aos seus olhos. Não! Ao menos permitam-me o cigarro e a falsa sensação de conforto e bem-estar que ele acarreta! Decido: Não vou deixar de fumar! Apesar de incriminado por este acto, também tenho todo o direito de vivê-lo descansadamente. Não cometi nenhum crime, pois, não? E, para mais, procuro ter cuidado nos lugares onde fumo para não incomodar ninguém. Sei que um dia irei morrer, se não for disto será de outra coisa, mas ninguém é eterno. Por isso deixem-me em paz e sossego, está bem? Tudo o resto, depois se verá.
Uma coisa é certa: Vou tentar mudar! Devo estar a ficar decrépito, melancólico, gasto, caduco mesmo, embora não o queira aceitar. Vou tentar mudar porque decidi. Apesar de não pactuar com o mal, ser pouco sociável, ter ideias e pensar, acreditem ou não: Vou mudar! Ao menos vou tentar! Quero que acreditem, porque é ponto assente! Irreversível! E, depois, não digam que não acreditam! Que é impossível! Serei um membro da família sincero, útil, dedicado e conformado!