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Monday, November 13, 2006

A minha Tia Judite e o nosso Sono profundo

A minha Tia Judite e o nosso Sono profundo



Já em casa de meus pais, relembro-me de um episódio com a minha Tia Judite. Eu e o meu irmão, João, adorávamos dormir. Dormir até quando nos deixassem. Vivíamos num apartamento, junto do Mercado Municipal de Vila Real. Como era habitual, em dias de feira, a Tia Judite deslocava-se até lá, sempre escorreita e desejosa de lá comparecer, ao mesmo tempo, que aproveitava para nos visitar. Ora, um dia em que a feira acontecia subiu a escadaria de casa de meus pais e bateu à sua porta com uma energia desmedida, que não passara despercebida aos vizinhos, como sempre o fazia, e chamando muito alto por nós. Todos ouviram, só nós é que não. A sua voz ecoou por todo o prédio e aquela habitação até quase tremeu, dado o impacto provocado pelo seu chamamento e pelo barulho manifestado. - Manel, Joãozinho, sou eu. Abram a porta! - gritou, com todo o seu ímpeto posto na voz. Bateu uma, duas, três vezes. Chamou uma, duas, três vezes e o seu grito fez-se ouvir por todos os moradores que àquela hora estavam nas suas casas. Acorreram todos, aflitos. A Tia Judite virou-se para eles e disse, trémula:- Só podem estar mortos lá dentro! Estão mortos, de certeza!
Toda aquela gente entrou em pânico, pensando em como abrir aquela porta e como estaríamos nós.
Em voz de comando, a minha Tia Judite ordenou:- Rebentem a porta! Estão mortos! Estão mortos, de certeza!
Imediatamente, se juntaram mais pessoas e a porta foi mesmo arrombada e toda aquela gente, conhecida e desconhecida, entrou pelo nosso quarto dentro. Acordamos de imediato, surpresos e amedrontados. Nunca tínhamos visto tanta gente no nosso quarto. Notei-lhes na expressão um aspecto e um semblante de desilusão, como que dizendo: -Afinal estão vivos! Estão vivos e bem vivos! Que chatice!
De imediato, toda aquela multidão debandou inconsolável, perante a falta de acção no desfecho desta situação e a minha Tia Judite nem nos recriminou e só exclamava, emotiva:- Era o sono da morte! Era o sono da morte!
E, foi assim, que entrou em nossa casa!
Pena, Janeiro 2005