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Saturday, May 05, 2007

Diário de um Professor II


Diário de um Professor II

11 de Janeiro do ano de 2007
Recordando...
Àquela hora, a sala de Professores estava quase vazia.
Eu cumpria o meu horário de substituir algum docente faltoso, por força da sua vida, por vezes difícil e complicada que exige que estejamos presentes em todos os seus instantes, prontos a acarinhar e intervir numa família que é a nossa, que nos ama e nos espera ansiosamente, para tomarmos conta dela com toda a dedicação e atenção.
Quando alguma coisa não está bem com ela, surge a falta e a penalização pela nossa ausência.
Aqui e ali, reparava nas conversas. Escutava sem participar, remetido a um silêncio atento, condescendente e, penso, que simpático.
- Quanto pagas ao banco pela prestação da tua casa? – Ouvia sem me imiscuir no diálogo.
- O teu filho melhorou? - Escutei.
- Aquele aluno preocupa-me...
Falavam com seriedade sobre assuntos que deveriam confidenciar só para si.
Fechei os olhos. Fechei os ouvidos. Girei a chave do pensamento que possuo escondida e ignorada de todo o Mundo, porque é só minha, e pensei.. Pensei, alheado deles, que as suas preocupações são e serão sempre as minhas preocupações. Pensei que habitavam um Planeta igualzinho ao meu Planeta.
Senti passar por mim uma emoção e um desejo de fugir, largar tudo o que ali tento fazer e sentir o calor e a chama de compreensão e do amor da minha família. Jamais a trocaria ou venderia pelo muito que lhes quero! Senti o seu abraço e a ternura que lhes corre no sangue e a entrega aos valores e princípios que os orienta em tudo o que fazem e desejam de bom. Com um coração enorme nas mãos.
Jurei amá-la! Com convicção. Um amor convicto de estima e consideração!
Nisto, ouvi um rumor de agitação, naquela imensa pacatez de agradável sobriedade.
Vários Professores entravam, ruidosamente. Gargalhavam entre si, em animada cavaqueira.
Apurei todos os meus sentidos com esforço.
Falavam do tempo. Como se o tempo tivesse importância. Irrita-me falar do tempo na escola, quando ela é dos alunos, sabem?
Faz-me pensar que falar do tempo surge, quando não há mais motivos de diálogo, de conversa. Assim, como me irrita criticar quem quer que seja sem a sua presença. Talvez, eu seja complicado, mas não me falem do tempo ali, nem maltratem quem não tem hipóteses de explicar-se, por estar ausente. Por favor! Não façam isso. Falem de vós próprios e dos alunos.
Torna-se mais agradável e saudável.
Não quis ouvir mais e fui-me embora. Saí. Aquilo não era para mim.
Restava-me ainda um cigarro no maço para fumar e foi o que fui fazer.
Tirei umas fumaças para descansar o espírito, longe de olhares desaprovadores e de recriminação.
Depois, fui ao encontro das silhuetas vivas e merecedoras de toda a minha atenção, que são indiscutivelmente, os alunos. Ao menos estes, raramente falam do tempo e, quando o fazem, é estimulante e interessante ouvir.
Desculpem, eu sou assim! Muito complicado!
Quando soou a campainha da aula final, sobressaltei-me de alegria.
Cumprira-se mais um acto de amor com os alunos.
Agora, ia ter com os meus!
Descansar...
Como se eu pudesse descansar...?
Como se eu pudesse esquecer...?
Talvez, descansar o pensar e arrumar as ideias.
Só arrumá-las e bem arrumadinhas porque necessitam de serem arrumadas.
Arrumadas na prateleira do que sou.
Na prateleira que habita em mim.
Só minha, porque está repleta de sonhos.
Repleta de pensamentos.
Cheia! Está cheia. A estante de mim.
Mas, por favor, não me falem do tempo ou de alguém que não está presente, na escola. Não?
Há mais que dizer. Muito mais.
E, vale a pena. Podem crer.

Diário de um Professor, 11 de Janeiro do Ano de 2007
Recordando...
By Poliedro num dia agitadíssimo.