Recordações de Infância: O atropelamento inevitável de que fui alvo!
Na minha turbulenta infância tudo corria mal para mim. Fui atropelado! Atropelado por um respeitador cidadão que conduzia muito bem. Não estou a brincar conduzia mesmo muito bem! Tudo ocorreu quando o crepúsculo se punha já no horizonte.
Ocorreu, mesmo defronte da enorme janela de casa da minha avó, na Avenida Marginal que serpenteava e dava cor à cidade de Vila Real. Dali divisava-se o rio lá ao fundo, as suas margens e a ponte de ferro. Aquela janela tinha servido para nas tardes sossegadas de Verão contarmos os carros que passavam e anotar as suas marcas e as suas matrículas. Verdadeiramente só sei que era ali que passávamos grande parte do nosso tempo, ainda por cima com a aprovação sincera da minha avó Maria que se embrenhava nas malhas, nas lãs ou nos novelos. Talvez pensasse que assim lhe daríamos alguma tranquilidade e paz de espírito.
Olhava-nos demoradamente por cima dos óculos, sorria e aprovava. Penso que gostava de ver-nos por perto, sobre a sua alçada protectora e, inequivocamente, atenta à nossa traquinice e inquieta conduta. Por vezes desconfiava e inquiria-se se a nossa postura não esconderia alguma doença digna de cuidados médicos. Mas, não! Estávamos bem de saúde, com uma saúde de ferro.
As preocupações e desconfianças da minha avó eram bem justificadas. Ela tinha razão nas suas dúvidas quanto ao nosso comportamento.
Foi dali que a minha avó presenciou o meu atropelamento nesse dia das nossas rotineiras e normais brincadeiras, em pleno asfalto do passeio da Avenida Marginal,
De súbito, perdi a calma, eu que a tinha até em demasia e atravessei a estrada a correr sem antes observar se o podia fazer. Foi o suficiente! Um automóvel que circulava de forma atenta e prudente e passava ali, “pum”! Acertou-me em cheio. Voei uns dez metros pelo ar e aterrei no alcatrão, sem contemplações.
Levantei-me e vislumbrei a minha avó reclamando uma ambulância e acenando uns gestos esquisitos que me pareceram de alguém totalmente em pânico. Desorientado.
Não conseguia parar de gesticular freneticamente apelando e ordenando a todos por auxílio imediato. Quando me levaram para casa da minha avó pelo meu pé telefonaram, incomodaram o meu pai, entretido a jogar dominó no saudoso café Excelsior, Lá apareceu embebido na sua calma e boa disposição para me levar ao hospital. O condutor do automóvel que ia para Aveiro é que estava inconsolável, honesto e humano que era e isento de culpa. Meu pai compreendeu de imediato a sua preocupação e calmamente, como era seu hábito, disse-lhe que não tinha culpa.
Meu pai, que era um bom pai acercou-se de mim, pegou-me ao colo, meteu-me no carro e levou-me para o hospital, sempre sorrindo e animando-me com convicção que felizmente, não acontecera nada de grave. Meu pai compreendia-me totalmente! Não sei se queria regressar ao dominó, mas penso que não.
No hospital fui observado, tendo os médicos diagnosticado que eu não sofrera traumatismos graves.
Apenas de algum repouso e uma semana de restabelecimento na cama. Era o que eu queria ouvir! Uma semana sem ir à escola!
Fui para casa.
No dia seguinte, quando acordei doía-me tudo. Permaneci deitado o dia todo, blasfemando incongruências sobre o meu estado e constatando que afinal não era lá muito agradável permanecer deitado ali durante aquele período de tempo todo.
Nisto, bateram à porta. Era o Carvalhinho de Matos Torres. Eu tratava-o assim. Tratava-o sempre assim, pelo seu nome todo. Trazia chocolates, doces, pastilhas elásticas e tudo o mais que comprara para me presentear.
O Carvalhinho de Matos Torres seria a minha vítima!
Escolhi-o porque estava doente e apesar das melhoras decidi que estava muito doente. Se o que ele me trazia era porque estava muito enfermo, então, o meu restabelecimento duraria não uma semana, mas duas. Todos os dias me levava doces, bolos e chocolates e me perguntava se estava melhor, ao que eu respondia que ainda sofria muito e que aquilo tudo que ele me levava ajudava bastante na minha convalescença.
Foi, então que a minha mãe detectou a farsa e o meu desplante face ao Carvalhinho de Matos Torres.
Proibiu-lhe a entrada em nossa casa com determinação e.”enxotou-me” em direcção à escola. Tinha terminado a minha doença! Tinha terminado o meu sofrimento!
Sempre admirado e, incompreendido pela atitude e pelo gesto de minha mãe, pedi desculpa ao meu bom amigo e jurei nunca mais brincar com as doenças e portar-me bem em relação ao estado de saúde das pessoas.
Tinha aprendido a lição na sua total e íntegra plenitude!
Pena.
25.05.2011
Oxalá se lerem gostem?
Foi a pensar em Vocês.
Bem-Hajam, pela simpatia constante.
MUITO OBRIGADO!
São Perfeitos (as) e Fabulosos (as)! Todos VOCÊS!
Estou Fascinado.
Peço Desculpa sem culpa nenhuma, amigos visitantes.
Aliado a problemas do foro pessoal, os vossos preciosos comentários não “saíam”, daí optar por escondê-los. Sei que entenderão, não me era possível mostrá-los por um vírus grandioso no E-mail de suporte ao blogue.
Com a minha explicação espero que entendam.
Não tive culpa.
Agora parece tudo ter regressado ao normal.
Irei responder com todo o gosto como sempre o fiz.
Bem-Hajam, pelo vosso encanto e ternura.
Sempre a estimá-los e a respeitá-los imenso.
pena